- Cleia Viana / Câmara dos Deputados
Cleia Viana / Câmara dos Deputados
Por Chico Alves

Cientes de que os eleitores brasileiros estavam fartos das negociatas feitas por quem deveria zelar pelo bom uso do dinheiro público, muitos candidatos se apresentaram na última eleição como representantes da renovação. Não foram poucos os eleitos somente por encarnar a ideia de moralização. Nesse caso está o próprio presidente, que, como muitos deputados e senadores, prometeu tornar transparentes as relações entre Executivo e Legislativo. Deram a esse movimento o nome de 'Nova Política' e garantiram que os tempos de "toma lá dá cá" tinham ficado no passado. Bastou, no entanto, a votação no Congresso do primeiro projeto importante para que a promessa fosse por água abaixo. Para garantir a aprovação da Reforma da Previdência , o governo vai gastar quase R$ 5 bilhões em emendas parlamentares.

Como a coluna informou ontem, foi a demora na liberação desse dinheiro que adiou a votação do projeto em segundo turno na Câmara. Deputados disseram que só votariam depois que os recursos estivessem garantidos, mas o governo só queria empenhar a grana depois de aprovar a reforma. Como definiu o deputado Paulo Ramos (PDT-RJ), a queda de braço era para saber quem entregava primeiro a sua fatura. Resultado: o Executivo pediu ao Legislativo permissão para gastar mais R$ 3 bilhões na empreitada. Obviamente, conseguiu, e o projeto saiu vitorioso, por 369 votos a 124.

"A aprovação da Reforma da Previdência foi aula de corrupção", acusa o deputado Ivan Valente ( PSOL-SP). Segundo ele, R$ 1,6 bilhões foram tirados do Ministério da Saúde para emendas não impositivas. "Bolsonaro prometeu R$ 5,6 bilhões e mais de 300 cargos de confiança".

Sobre as emendas impositivas, parlamentares e governo se defendem dizendo que essas são verbas obrigatórias. Meia verdade. O Executivo só libera emendas quando tem dinheiro em caixa, e não tinha. Tanto que pediu recursos suplementares para atender a esses pedidos. Além disso, todos sabem muito bem que o ponto chave é o ritmo da liberação: só quem votou a favor da reforma foi beneficiado dessa vez. Aos contrários, nada. A defesa da prática feita pelos políticos de agora em nada difere do que fizeram os chamados praticantes da "Velha Política", tão criticados nas eleições.

Na negociação, o governo foi mais longe e tirou até mesmo dinheiro da Saúde para as emendas que não eram obrigatórias. Isso sem falar em centenas de cargos.

O discurso de renovação e moralização com que muitos foram eleitos perdeu o sentido na noite de ontem. Esses devem decidir: ou o "toma lá dá cá", que tanto criticaram, é um expediente republicano, normal na relação entre Executivo e Legislativo ou eles traíram a promessa feita nas eleições. Manter a bandeira da "Nova Política" com as mesmas práticas de antes é que não dá.