Agentes especializados em negociação são escolhidos entre os mais experientes da tropa e passam por curso de 40 a 50 dias
 - fotos Reginaldo Pimenta
Agentes especializados em negociação são escolhidos entre os mais experientes da tropa e passam por curso de 40 a 50 dias fotos Reginaldo Pimenta
Por Thuany Dossares e Maria Luisa de Melo
Preservar vidas em situações de tensão através do diálogo e do convencimento. Esta é a missão dos negociadores - grupo altamente especializado, que atua para evitar suicídios e finalizar sequestros, como o que aconteceu na última terça-feira (20), na Ponte Rio-Niterói. No Rio, a única unidade especializada em negociação pertence ao Batalhão de Operações Especiais (Bope) e se tornar um negociador não é tarefa fácil. Os agentes passam por um curso específico com duração de 40 a 50 dias.

A formação inclui aulas de Psicologia, estudo de psicopatias, dos principais efeitos de drogas e de alterações de humor. Saber de cor os principais perfis criminosos existentes também é obrigação deste agente. "Ele age quase como um psicólogo, mesmo sem ter essa formação. Recebe instruções para entender os mais diversos tipos de relações humanas", explica o comandante do Bope, coronel Maurílio Nunes.

Tenente-coronel da PM de São Paulo com 11 anos de experiência como negociador, Diogenes Viegas Dalle Lucca, destaca que o primeiro passo do trabalho consiste em conquistar a confiança do sequestrador. "É fundamental estabelecer uma relação com ele e despertar empatia", explica Lucca, ex-comandante do Grupo de Ações Táticas Especiais (GATE) e integra o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

De acordo com ele, ao começar a negociação, o agente diz ao sequestrador que está ali para fazer um acordo, perguntando o que ele deseja e dizendo que ele "não precisa piorar as coisas". Feito isso, a tentativa é de sensibilização para a libertação dos reféns. "Se tivermos idosos e crianças, apelamos fortemente para isso, pedindo que sejam libertados", completa Lucca. "Esse diálogo é importante para sabermos com que tipo de sequestrador estamos lidando", acrescenta.

As negociações podem ser feitas cara a cara ou através de rádio ou telefone. No caso da Ponte, foi usado um rádio, da Polícia Rodoviária Federal, a primeira a chegar ao local do sequestro. O aparelho estava dentro de uma caixa de papelão deixada na porta do ônibus da Linha 2520 (Jardim Alcântara X Estácio).

Neste caso, foram feitos pelo menos cinco contatos com o sequestrador Willian Augusto da Silva. Nos diálogos, ao ser questionado sobre o que desejava, o "tomador" deu respostas desconexas e a negociação não evoluiu. Assim, os agentes apelaram para outras alternativas táticas, conforme prevê a doutrina de gerenciamento de crise, originária do FBI e usada no Brasil desde 1994. "A tática usada quando a negociação não evolui depende dos indicadores de violência do sequestrador. Pode-se usar eletrochoque, tiro de borracha, gás lacrimogênio, uso de sniper ou assalto tático. Depende do caso", explica.

Ao explicar a atuação dos negociadores, o comandante do Bope destaca também a importância dos psicólogos, responsáveis por traçar o perfil do sequestrador. "O sucesso da ação depende muito também do trabalho do psicólogo, que traça o perfil do sequestrador. É a partir desse perfil que se define a estratégia de negociação", diz.

Só os mais experientes tem vez

No caso do Batalhão de Operações Especiais (Bope), não basta só ir bem nas avaliações teóricas, práticas e psicológicas. A experiência de vida e na corporação também são pontos importantes, segundo o comandante do Bope. coronel Maurílio Nunes. O negociador mais jovem do Bope está há 20 anos na corporação.

"O negociador tem que ser um cara mais experiente. A experiência de vida e profissional ajuda muito na hora de negociar", diz. "Os anos de vida, de corporação, de operações especiais, dão mais conhecimento. Não que um mais novo não tenha condição de exercer o trabalho, porém, quando você tem um conhecimento técnico, maiores possibilidades de se entender o que está acontecendo para tomar decisões".

Tanto Nunes quanto o ex-comandante do GATE Diogenes Lucca, chamam a atenção para uma recente mudança no perfil de sequestradores. "Antigamente, até 2010, mais ou menos, era muito comum termos que intervir em episódios com sequestradores com motivação financeira. Agora, os casos envolvem mais crimes passionais, drogas e problemas psicológicos", observa.

Nunes também atenta para o protagonismo das doenças psicológicas. "As pessoas andam muito estressadas e isso são gatilhos para criar crises. Por isso, precisamos sempre aperfeiçoar as nossas respostas", destaca.