Robertinho Silva em sua nova residência, no Retiro dos ArtistasArquivo Pessoal

Rio - Considerado um dos maiores bateristas e percussionistas do Brasil, Robertinho Silva, de 82 anos, é o mais novo morador do Retiro dos Artistas, em Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio. Desde o dia 19 de abril, o veterano, que tocou com grandes nomes da MPB, passou a viver na instituição, que abriga, ainda, outros 50 nomes que fizeram história da música, na TV, no teatro, no cinema, no circo e no esporte.
Em conversa com O DIA, Robertinho conta que morava com sua companheira, com quem foi casado por 17 anos, mas precisou buscar um novo lar depois do fim do relacionamento, em maio do ano passado. Após um tempo morando na casa do filho e da nora, ele decidiu viver no Retiro.
"No começo eu não queria vir pra cá não. Cabeça de garotão, nem pensava nisso. Depois cheguei a conclusão que a partir dos 80 anos, a gente passa a ser uma pessoa incômoda, dependente. Vim pra cá e achei o lugar certo, estou adorando. A casa aqui tem tudo que gosto. Meu filho montou tudo do meu jeito, com um monte de instrumento, frigobar para tomar um suco gelado... Estou muito feliz aqui", revela Robertinho.
Há três semanas vivendo na centenária instituição, o percussionista reencontrou grandes amigos de profissão, muitos, inclusive, que trabalharam com ele. O baterista e percussionista Airto Moreira, o maestro e pianista Mauro Continentino, além do ritmista mangueirense Carlinhos Pandeiro de Ouro são alguns desses companheiros de estrada.
Próximo de completar 83 anos, no dia 1º de junho, Robertinho nem pensa em se aposentar. Ele já conversou com os administradores do espaço, que deram toda a liberdade para que o músico possa sair para realizar projetos.
"Aposentadoria leva para a morte. Ainda estou envolvido em um monte de projetos, estudo percussão e ritmos 24 horas por dia. Estou montando um trabalho de percussão para dança contemporânea e começando a escrever meu quinto livro: 'Movimentar o corpo e a sonoridade percussiva'. Também estou trabalhando em um projeto para apresentar na orquestra sinfônica, em São Paulo. Quero valorizar mais ainda a percussão brasileira, que ainda sofre preconceito", diz.
Robertinho Silva teve seu primeiro contato com percussão ainda criança, aos 9 anos. Com o sonho de ser músico de orquestra, viajou o mundo com seu talento, sempre acompanhado de grande artistas da MPB, como Milton Nascimento, com quem trabalhou por 26 anos. Recentemente, o artista também tem se dedicado à literatura, lançando quatro livros.
A administradora do Retiro dos Artistas, Cida Cabral, deu as boas-vindas ao novo morador. Segundo ela, esse era um desejo antigo de Robertinho, que já vinha solicitando uma vaga na instituição.
Fundado em 1918, o Retiro é o único espaço do gênero no país, idealizado para servir de moradia digna para artistas idosos com dificuldades financeiras, problemas de saúde ou sem apoio de familiares e amigos. Com 105 anos de existência, a instituição sobrevive por meio de doações, que podem ser feitas pelo site oficial, e de um bazar.
"Os artistas se sentem muito seguros quando chegam aqui. Apesar de todas as dificuldades que encaramos por depender de doações, nós temos toda uma estrutura, com equipe médica, plano de saúde e planos alimentares. Além de toda a infraestrutura do local, com teatro, cinema, biblioteca e salão de beleza. Isso tudo traz muita segurança para que quando chegue a hora deles terem um descanso, fiquem muito tranquilos", reforça Cida.
Trajetória
Nascido em 1941, Robertinho Silva foi criado em Realengo, Zona Oeste do Rio. Aos 10 anos, montou sua primeira bateria, feita com sacos de cimento.
O primeiro trabalho como percussionista foi ao 15 anos, em um baile, em Bento Ribeiro, na Zona Norte. Aos 19, Robertinho já tocava em diversos bailes da cidade. O primeiro contato com um grande artista da MPB foi em 1964, quando tocou com Cauby Peixoto. Em 1969, iniciou uma grande parceria com Milton Nascimento.
Considerado o principal baterista do Clube da Esquina, grupo formado por Milton, Lô Borges, Milton Guedes, entre outros, Robertinho gravou, ainda, com Tom Jobim, Miúcha, Gonzaguinha e Nana Caymmi.
Lançou o primeiro livro em 2013, em parceria com o jornalista Miguel Sá. "Se Minha Bateria Falasse" é uma biografia dos seus mais de 50 anos de carreira.
Sua segunda publicação foi "A Força do Tambor: Robertinho Silva, o Griô da Fala Musical", lançada em 2019 em parceria com Paulo Nunes. No ano seguinte, em 2020, lançou "Coração Mineiro". No ano passado, o músico finalizou seu quarto livro, "Ritmos Brasileiros em Forma de Rudimentos", escrito com Mariozinho e André Soltau.
 
*Reportagem do estagiário João Pedro Bellizzi, sob supervisão de Raphael Perucci